Em tempos de tanta intolerância, debater o racismo, além de ser importante, contribui para aumentar e fortalecer a consciência social do Brasil. O tema é fio condutor de “Race”, peça com direção de Gustavo Paso e realizada pela CiaTeatro Epigenia, que fica em cartaz até 20 de dezembro no Teatro Poeirinha, Botafogo, na Zona Sul do Rio. O texto, ganhador do prêmio Tony, é de David Mamet – um dos mais aclamados dramaturgos americanos -, e fala do preconceito racial, sexismo, violência contra a mulher e manipulação, com a proposta de causar reflexão e diversas interpretações, com inteligência.
O ator Yashar Zambuzzi vive Charles Strickland, homem branco de alto poder aquisitivo, muito conhecido por este aspecto. Casado, vive sob os padrões normais de uma sociedade judaico-cristã, católico, mas que tem seu fraco por mulheres negras. Ele se apaixona por uma jovem garota de programa negra. Ele cuida dela de todas as formas, inclusive afetiva e financeiramente, ela o acusa de estupro. Não aguentando a pressão da própria consciência, Charles confessa publicamente o delito e é, a partir da construção de defesa dele, que se estrutura o trabalho.
Completam o elenco Luciano Quirino e Gustavo Falcão. Eles interpretam, nesta ordem, um advogado negro e um branco. Ambos e a atriz Heloisa Jorge, a assistente do escritório de advocacia, discutem os assuntos com diálogos fortes, tratando de preconceito até contra pessoas da mesma etnia. O objetivo é mesmo causar questionamentos para mudanças de pensamentos. Há até conversas pós-peça dos atores com o público para debater os temas apontados.
“Esperamos que esses mesmos assuntos não tenham mais razão de ser”, ressalta ator
De acordo com o diretor Gustavo Paso, uma obra teatral que fale diretamente ao espectador atento e inteligente sempre causará efeitos duradouros. “Race é para quem quer conhecer e reconhecer suas próprias dificuldades, além das pessoas que ignoram os problemas de uma sociedade eticamente frágil”, ele afirma.
Yashar Zambuzzi comenta a necessidade de discutir estas problemáticas, com o intuito de desconstruir fenômenos históricos ligados à raça, direito e outros assuntos. “Num futuro próximo, esperamos que esses mesmos assuntos não tenham mais razão de ser, pois necessário se faz uma sociedade mais justa”, reforça Yashar. Luciano Quirino vai mais além, dizendo que é impossível sair desse espetáculo ileso. “A peça traz questões como racismo, culpa, vergonha, mentira de maneira contundente, impactante pra uma reflexão profunda com as feridas de cada de nós à mostra”.
“Esperamos que esses mesmos assuntos não tenham mais razão de ser”, ressalta ator
Em primeiro plano, o ator Gustavo Falcão, seguido de Heloisa Jorge, Yashar Zambuzzi e por último, Luciano Quirino (Foto: Bruno Veiga)Para Heloisa Jorge, todo ator tem uma responsabilidade social e a arte como profissão precisa ir além do comunicar ou do entreter. “Race é um presente para qualquer ator, que esteja minimamente “incomodado” com as estruturas vigentes. O texto do Mamet desafia o público à medida que as idéias pré-concebidas são confrontadas com os argumentos contundentes.”
A atriz complementa que o texto em questão revela, sobretudo, a natureza humana. “David Mamet consegue com maestria elevar o seu texto a um patamar que extrapola as fronteiras norte americanas e o torna universal. Pela primeira vez esse texto é montado no Brasil, e eu me orgulho em fazer desta história junto a artistas tão comprometidos com o nosso ofício e com o nosso tempo”, vibrou Heloisa.
“Race” faz parte de uma trilogia da CiaTeatro Epigenia, que aborda temas modernos de textos escritos por David Mamet. A primeira parte, “Oleanna” (2014), falou de poder, incomunicabilidade e politicamente correto. A última se chama “Speed-The-Plow” (traduzida por aqui como Hollywood) e discutirá até onde o capitalismo pode interferir na arte. Bom é quando, além de entreter, a cultura pode ensinar, ajudar e transformar pensamentos intolerantes.
Peça “Race” no Rio de Janeiro
Datas e horários: até 20 de dezembro, de quinta a sábado, às 21h e domingo, às 19h
Local: Teatro Poeirinha – Rua São João Batista, 104 – Botafogo – Telefone da Bilheteria: 2537-8053.
Ingressos: Valores: R$ 50,00 (inteira) e R$ 25,00 (meia entrada)
Duração: 75 minutos
Classificação: 14 anos
Lotação: 60 lugares
Gênero: Drama