Irene Ravache é considerada uma das melhores atrizes de sua geração. Não é por menos. Sua personagem Vitória em “Além do Tempo“, novela das sete da TV Globo, foi considerada uma das vilãs mais cultuadas dos últimos anos na primeira fase da trama. A mulher amargurada que a atriz deu vida caiu na graça do público. E isso, sem dúvida nenhuma, é mérito de sua intérprete. A personagem mostrou toda a sua vilania na primeira fase da trama de Elizabeth Jhin e agora na segunda fase, a atriz tem um desafio pela frente, de conquistar o público com essa “nova” personagem, que continua amargurada. Irene tem tudo para tirar isso de letra. Em uma conversa intimista com essa dama da tevê, o Almanaque da Cultura perguntou um pouco de tudo. E, claro, ela respondeu com toda cordialidade do mundo.
Almanaque da Cultura: Emília volta como filha de Vitória. Como está sendo isso?
Irene Ravache: A Emília (Ana Beatriz Nogueira) sabe, o Alberto (Juca de Oliveira) sabe, e, o público sabe que a Emília é a filha dela. Ela não sabe! Pra ela, a Emília está morta. A menina morreu. E, o Alberto diz para ela que a Emília morreu. Então, eu acho que é uma relação difícil. A filha é algo que ela não fala. Não comenta com ninguém. É tão doloroso, é tão doloroso, que ela não comenta.
Almanaque da Cultura: Ela volta falida. Você acha que o dinheiro pode mudar as pessoas?
Irene Ravache: Lógico que muda. Olha o país que nos vivemos. Olha o que o dinheiro está fazendo nas pessoas. Lastimável!
Almanaque da Cultura: Na primeira fase, a personagem foi a grande vilã. Foi a repercussão nas ruas?
Irene Ravache: As pessoas são muito carinhosas comigo. Tudo muito simpático. Elas falam: “Puxa, como você é ruim, né?”. É sempre uma coisa muito delicada e amorosa. Todos nós envelhecemos e o público também envelheceu. O público que não sabia distinguir personagem de ator, hoje é diferente. Quando acompanham um trabalho, eles cumprimentam pelo trabalho. Isso é um rastro de confiança entre o artista e o seu público. As pessoas me cumprimentam pelo trabalho.
Almanaque da Cultura: Quais são as transformações da personagem nessa nova fase?
Irene Ravache: Ela não tem mais poder, vai viver de favor. Ela não tem mais a sua casa, é uma mulher extremamente solitária e muito amargurada. Ela carrega uma grande dose de tristeza. Ela é como toda pessoa que é sozinha: sobrevive. Aprendeu a lançar mão de algumas coisas para a sua sobrevivência. E, às vezes ela não tem muito escrúpulo de usar essas coisas. Mas ela não é uma tirana, uma Condessa, uma prepotente. Isso ela não é mais, porém, ela tem uma grande dificuldade de viver fora do meio social dela. Isso ela tem. e ficará claro nas cenas.
Almanaque da Cultura: Seu neto (Cadu Libonati) está nessa segunda fase. Você já chegou a gravar com ele?
Irene Ravache: Não! Não sei se vamos contracenar juntos. Nós não vamos juntos para o Projac (Central Globo de Produção na Zona Oeste do Rio de Janeiro). A carona dele é outra. Ele mora no Jardim Botânico (Zona Sul) e eu na Barra da Tijuca (Zona Oeste). O nosso encontro é aqui mesmo no Projac.
Almanaque da Cultura: O que mais agrada você no texto dessa segunda fase?
Irene Ravache: O que mais me agrada é essa teia que envolve essas pessoas. A teia dos relacionamentos, dos parentescos, da inversão, do fato da Condessa viver de favor na casa da Zilda (Nívea Maria). Isso é uma grande sacada. Essas mudanças me agradaram muito. Gostei bastante.
Almanaque da Cultura: Como você vê o tema da encarnação inserido nessa trama?
Irene Ravache: Sem dúvida nenhuma é uma nova novela. O tema da encarnação eu tenho impressão que agrada. Até para quem não acredita. É porque ele vem tão recheado de esperanças, possibilidades de uma nova vida, de novos relacionamentos, possibilidades de resgate. Então, mesmo que você não acredite, é uma coisa que você pode usar para a sua vida. Se a gente observar um pouco, deixamos uma amizade no meio do caminho e a gente não sabe o porquê daquilo. Às vezes não é por nada, é pela vida mesmo. Pequenas reparações, novo olhar sobre as pessoas. Então, uma novela espírita, dá essa chance do perdão. É muito difícil exercer o perdão a começar pela gente mesmo, né? Se perdoar. O perdão é o primeiro caminho para quem realmente quer mudar a vida.
Almanaque da Cultura: Como foi interpretar essa grande vilã na primeira fase?
Irene Ravache: Foi maravilhoso! O texto da autora e da equipe, eles não tiveram pudor. Não ficaram preocupados com o politicamente correto. A personagem não tinha o menor problema de ser como ela era. Nenhuma autocrítica. Ela era assim e ponto final. Isso não é sempre que a gente tem chance. Foi muito bom. Sem falar que a novela é lindíssima. A trama é muito bem escrita, bem dirigida, bem escalada. Vou sentir falta dos cenários e dos figurinos da Condessa (risos). Acho a novela deslumbrante!
Almanaque da Cultura: Tem alguma cena que marcou você nessa primeira fase?
Irene Ravache: A cena que realmente ela revê o filho. É uma cena muito importante. Uma coisa que ela esperou por muito tempo. É uma cena muito bonita e muito emocionante. Gravamos de primeira. Essa é uma das cenas que me marcaram bastante. Tocou-me bastante.
Almanaque da Cultura: Você é considerada uma das melhores atrizes de sua geração. Ainda bate aquele friozinho na barriga?
Irene Ravache: Claro que bate! Eu tenho esse frio na barriga. Pode ser que outros não tenham. Eu tenho. Sempre!
Almanaque da Cultura: Na festa da novela, você comentou que não tinha lido a sinopse da trama. Quando você mexeu nela?
Irene Ravache: Foi a melhor coisa que eu fiz! Comecei mexer nela há um mês, antes da virada. Eu fiquei bem surpresa. Essa virada vai ser interessantíssima e desafiante para todos os envolvidos na trama. Costumo dizer que estamos navegando em um mar calmo. E, agora estamos indo para outra rota. E, a gente não sabe se vem tempestade. Se a gente vai dobrar o Cabo da Boa Esperança ou se a gente vai dar em costas brasileiras (risos).
Almanaque da Cultura: Em sua opinião, qual foi o grande karma da Condessa?
Irene Ravache: Ela perdeu um filho vivo, né? E, nessa segunda fase também. Ela perdeu uma filha que está viva. Ela não sabe que a filha esta viva. Olha que Karma pesado.
Almanaque da Cultura: O que podemos aprender com essa história da Vitória?
Irene Ravache: Se você não resolveu um assunto pesado. Você fatalmente poderá repetir isso em outra vida. Ou seja, não espere ficar velhinha a beira da morte para resolver esses assuntos. Acreditando ou não na outra vida. Vá resolver! Vai pegar o seu desafeto e vai tentar resolver. Se o outro lado não quiser, você fez a sua parte.
Almanaque da Cultura: As cenas envolvendo a personagem são bem dramáticas. Como você desliga e volta a ser a Irene Ravache?
Irene Ravache: Eu penso na cena até fazer. Fez a cena acabou. Mas, acabou mesmo. Acabou ali dentro do estúdio. É um trabalho! É visto de uma forma muito fria inclusive. A emoção que vem é na hora que faz. A emoção termina na hora que acaba a cena. Eu não tenho isso que o personagem me pegou e tal. É evidente que têm umas cenas que mexem bastante. Teve uma cena que eu chorei de soluçar. Logico, que quando acabou alguém me trouxe um lenço. Contei até dez e ela (emoção) foi embora. Não é uma sessão espirita (risos).
Almanaque da Cultura: Qual o balanço que você faz da Vitória da primeira fase?
Irene Ravache: Fiz uma Vitória com dois lados. Uma mulher que manda queimar uma casa, que chama de idiota, mas uma mulher que sofre. Ela sofre a perda de um filho, a busca desse filho. Ou seja, ela é um ser humano. O público enxerga o meu trabalho, eles não confundem a atriz com a personagem. Gosto muito disso e estou feliz com esse retorno.